Caminhos Errantes

quarta-feira, julho 23, 2003

O primeiro

Este é um primeiro "post" experimental. Inauguro-o com a dedicatória que escrevi, neste ano lectivo, para o livro de curso dos meus alunos finalistas de Coimbra, esperando que sirva de mote aos textos que se escreverão nestas páginas.

O poeta Hölderlin atribuía à poesia duas qualidades só aparentemente contraditórias: ela seria, ao mesmo tempo, a mais inocente das ocupações e o mais perigoso dos bens. Assim é também o pensar. E assim a filosofia. Por isso, soprando a poeira de banalidade que se acumula nos exemplos tantas vezes aludidos, e tão raramente praticados, não exijamos de nós menos do que a partilha deste destino. Lancemo-nos na vida como Tales no seu poço, sem ficar à margem, troçando, numa troça anestesiada, com as escravas da trácia. Sem nos furtarmos ao seu mistério, encaremo-la de frente, em tudo o que é e representa: a doença, a loucura, a agonia, a dor, o mal, a morte, o nascimento, a alegria, a festa, a criação, a esperança, o amor. Mas façamo-lo sem peso e com uma coragem risonha. Longe da triste repetição de uma vida que seja só o passar das suas horas, guardemos para nós a mesma inocência com que a aurora, de dedos róseos, rasga nos seus cavalos alados o horizonte de cada manhã, trazendo a cada dia, seja de tempestade ou de sol, um largo sorriso sempre novo.