Caminhos Errantes

sábado, dezembro 03, 2005

O vindouro

Foi Heidegger quem determinou o modo de ser do homem não só pelo "ter sido" do seu estar já sempre lançado no mundo, não só pela Gewesenheit da sua Geworfenheit, mas pela sua abertura ao vindouro. Dasein ist nicht ein Vorhandenes, sondern es ist Möglichsein - A existência [modo de ser do homem] não é algo que esteja presente, mas é ser-possível. Não tenho o meu exemplar de Ser e Tempo à mão, mas estou quase seguro de não errar a citação. Hoje, aquilo que nos separa de Heidegger talvez seja justamente o desaparecimento do vindouro. Vivemos hoje essencialmente sem futuro e sem possibilidades, em "tempos de indigência", despojados da abertura a algo que estabeleça uma cisão, um corte, uma diferenciação (uma Ent-scheidung) entre o que foi até agora e o que está por vir. O que marca mais radicalmente o nosso tempo é, neste sentido, aquilo a que se poderia chamar um carácter anapocalíptico. E o à venir de Derrida expressa talvez aqui o nosso destino: um à venir caracterizado essencialmente por nunca vir; um advento que seja não presença do mistério e do extra-ordinário, mas precisamente a estranheza da sua ausência.