E depois do adeus
Há dois dias, em conversa com um amigo, chegámos à conclusão de que se poderia dizer, sem quaisquer pretensões cabalísticas, que, em Portugal, desde que há Constituição, os ciclos políticos se estendem por períodos de aproximadamente trinta anos. Foi primeiro o período que medeia entre a revolução de 1820 e a Regeneração, com a instabilidade da guerra civil e dos sucessivos levantamentos. Foi depois um ciclo de sessenta anos até ao fim da Monarquia, cortado mais ou menos a meio pelo projecto imperial africano que culminou, em 1890, com o Ultimato Inglês. Foi depois, em um pouco menos de trinta anos, a Primeira República, a “oligarquia das bestas”, como lhe chamou Fernando Pessoa, com as suas sucessivas ondas de levantamentos, assassínios, ditaduras e revoluções. Foi seguidamente o Estado Novo, a partir de 1933, que entra definitivamente em crise com a Guerra de África, nos anos sessenta do século XX; e que sucumbe finalmente, esgotado, em 1974, há exactamente trinta anos atrás.
Parece-me evidente que vivemos também hoje, em Portugal, numa atmosfera de “fim de ciclo”. Os Ministérios, as Secretarias de Estado, o Parlamento, os Municípios são hoje ocupados por um tipo humano que começa a ser dominante, para quem o sucesso é inversamente proporcional à inteligência, ao conhecimento, ao trabalho e ao mérito. Portugal é hoje um Estado quase puramente cacocrático (como kakos, em grego, quer dizer mau, a cacocracia, contrária de aristocracia, pode ser designada como o “poder dos piores”). No fundo, a nossa vida política reduz-se ao automatismo de um sistema em que um conjunto de grupos ou amigos, todos conhecidos entre si e repartidos tribalmente por uma variedade artificial de partidos, tenta aguentar o seu estilo de vida, perpetuando privilégios, rendimentos e influências. Em particular, são hoje sobretudo as juventudes partidárias que se ocupam a repartir bons ordenados e dinheiro fácil por jovens que, de um modo geral, não sabem o que é o estudo e o trabalho. Como os tempos da Revolução se vão afastando, é natural que cada vez mais a vida política se organize em torno da dependência destes jovens, chegados agora aos trinta e aos quarenta, em relação ao modo de viver a que entretanto se habituaram. Mas se é assim, também cada vez mais se torna necessário perguntar (como há trinta anos alguém perguntou) pelo estado a que chegámos. Há trinta anos, a senha para o desencadeamento das operações golpistas foi dada por uma música chamada “E depois do adeus”. Hoje, é irónico pensar que talvez seja apenas a incapacidade para pensar para além e para depois do adeus que mantém ainda em vida o nosso actual modo de vida político.
Parece-me evidente que vivemos também hoje, em Portugal, numa atmosfera de “fim de ciclo”. Os Ministérios, as Secretarias de Estado, o Parlamento, os Municípios são hoje ocupados por um tipo humano que começa a ser dominante, para quem o sucesso é inversamente proporcional à inteligência, ao conhecimento, ao trabalho e ao mérito. Portugal é hoje um Estado quase puramente cacocrático (como kakos, em grego, quer dizer mau, a cacocracia, contrária de aristocracia, pode ser designada como o “poder dos piores”). No fundo, a nossa vida política reduz-se ao automatismo de um sistema em que um conjunto de grupos ou amigos, todos conhecidos entre si e repartidos tribalmente por uma variedade artificial de partidos, tenta aguentar o seu estilo de vida, perpetuando privilégios, rendimentos e influências. Em particular, são hoje sobretudo as juventudes partidárias que se ocupam a repartir bons ordenados e dinheiro fácil por jovens que, de um modo geral, não sabem o que é o estudo e o trabalho. Como os tempos da Revolução se vão afastando, é natural que cada vez mais a vida política se organize em torno da dependência destes jovens, chegados agora aos trinta e aos quarenta, em relação ao modo de viver a que entretanto se habituaram. Mas se é assim, também cada vez mais se torna necessário perguntar (como há trinta anos alguém perguntou) pelo estado a que chegámos. Há trinta anos, a senha para o desencadeamento das operações golpistas foi dada por uma música chamada “E depois do adeus”. Hoje, é irónico pensar que talvez seja apenas a incapacidade para pensar para além e para depois do adeus que mantém ainda em vida o nosso actual modo de vida político.
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